Aula 2: Elementos básicos de liturgia (1)

 

Fontes da catequese (n. 90-109)[1]

90. As fontes das quais se vale a catequese devem ser consideradas em uma abordagem de correlação entre si: uma se remete à outra, enquanto todas são reconduzidas à Palavra de Deus, da qual são expressão. A catequese pode acentuar, a depender dos assuntos e contextos, uma das fontes em relação às demais. Isso deve ser feito com equilíbrio e sem a prática de uma catequese unilateral (por exemplo, uma catequese puramente bíblica, ou somente litúrgica, ou apenas experiencial). Entre as fontes, tem evidente preeminência a Sagrada Escritura, dada sua peculiar relação com a Palavra de Deus. As fontes, de certa forma, podem também ser vias da catequese.

A Palavra de Deus na Sagrada Escritura e na Sagrada Tradição

91. A catequese colhe sua mensagem da Palavra de Deus, que é a sua principal fonte. Portanto, é “fundamental que a Palavra revelada fecunde radicalmente a catequese e todos os esforços para transmitir a fé” (EG, n. 175). A Sagrada Escritura, que Deus inspirou, alcança profundamente a alma humana, mais do que qualquer outra palavra. A Palavra de Deus não se exaure na Sagrada Escritura, porque é uma realidade viva, operante e eficaz (Is 55,10-11; Hb 4,12-13). Deus fala e sua Palavra se manifesta na criação (Gn 1,3ss; Sl 33,6.9; Sb 9,1) e na história. Nos últimos dias, ele “falou-nos por meio do Filho” (Hb 1,2). O Unigênito do Pai é a Palavra definitiva de Deus, que estava no princípio junto a Deus, era Deus, presidiu a criação (Jo 1,1ss) e se fez carne (Jo 1,14) nascendo de uma mulher (Gl 4,4) pela força do Espírito Santo (Lc 1,35) para habitar entre os seus (Jo 1,14). Voltando ao Pai (At 1,9), ele traz consigo a criação redimida, que nele e para Ele foi criada (Cl 1,18-20).

92. A Igreja vive sua missão na espera pela manifestação escatológica do Senhor. “Essa expectativa nunca é passiva, mas a tensão missionária de anunciar a Palavra de Deus que cura e resgata cada pessoa: ainda hoje, Jesus ressuscitado nos diz: ‘Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa-Nova a toda a criatura’ (Mc 16, 15)” (VD, n. 121). De fato, “a fé vem pelo ouvir; e o ouvir, pela palavra de Cristo” (Rm 10,17). Por meio da pregação e da catequese, o próprio Espírito Santo ensina, gerando um encontro com a Palavra de Deus, viva e eficaz (Hb 4,12). Nas pegadas da Tradição, o pensamento e os escritos dos Pais da Igreja desempenham um papel importante. Como expressão da experiência eclesial do passado e da continuidade dinâmica que existe entre o anúncio dos primeiros discípulos e o nosso, 54 é bom que a vida e as obras dos pais encontrem lugar adequado entre os conteúdos da catequese.

O Magistério

93. Cristo deu aos Apóstolos e a seus sucessores um mandado permanente de anunciar o Evangelho até os confins da terra, prometendo-lhes a assistência do Espírito Santo (Mt 28,20; Mc 16,15; Jo 20,21-22; At 1,8) que lhes tornaria mestres da humanidade em relação à salvação, transmitindo oralmente (Tradição) e por escrito (Sagrada Escritura) a Palavra de Deus. O Magistério conserva, interpreta e transmite o depósito da fé, ou seja, o conteúdo da Revelação. Fundamentalmente, todo o povo de Deus é chamado a custodiar e a propagar o depósito da fé, pois é missão de toda a Igreja anunciar o Evangelho a todos os povos. Todavia, a autoridade para ensinar, de modo oficial e autorizado, a mensagem salvífica em nome de Jesus Cristo pertence ao colégio dos Bispos. Assim, o Romano Pontífice e os Bispos em comunhão com ele são os sujeitos do Magistério eclesial. Eles têm a responsabilidade primária de instruir o povo de Deus sobre o conteúdo da fé cristã e da moral cristã, bem como de promover o anúncio em todo o mundo (LG, n. 25).

94. A verdade salvífica permanece a mesma e imutável. Todavia, a Igreja no tempo conhece sempre melhor o depósito da Revelação. Verifica-se, portanto, um aprofundamento e um homogêneo desenvolvimento na continuidade da própria Palavra de Deus. Assim sendo, o Magistério serve à Palavra e ao povo de Deus recordando as verdades salvíficas de Cristo, esclarecendo-as e aplicando-as diante dos novos desafios das várias épocas e situações, agindo como uma ponte entre a Escritura e a Tradição. O Magistério é uma instituição positivamente querida por Cristo como elemento constituinte da Igreja. Escritura, Tradição e Magistério, portanto, estão intimamente unidos e nenhum deles existe sem os outros. Juntos, eles contribuem efetivamente, cada um à sua maneira, para a salvação da pessoa humana (DV, n. 10). A catequese é, entre outras coisas, uma mediação dos pronunciamentos do Magistério.

A Liturgia

95. A liturgia é uma das fontes essenciais e indispensáveis da catequese da Igreja, não só porque a partir da liturgia a catequese pode colher conteúdos, linguagens, gestos e palavras da fé, mas sobretudo porque elas se pertencem mutuamente no próprio ato de crer. A liturgia e a catequese, compreendidas à luz da Tradição da Igreja, embora cada uma tenha sua especificidade, não devem ser justapostas, mas devem ser compreendidas no contexto da vida cristã e eclesial e ambas são orientadas a viver a experiência do amor de Deus. O antigo princípio lex credenti lex orandi recorda, de fato, que a liturgia é um elemento constitutivo da Tradição.

96. A liturgia é “o lugar privilegiado da catequese do povo de Deus” (CIgC, n. 1074). Isso não deve ser entendido no sentido de que a liturgia deve perder seu caráter celebrativo e ser transformada em catequese ou que a catequese seja supérflua. Embora seja correto que as duas mantenham sua especificidade, deve-se reconhecer que a liturgia é o ápice e a fonte da vida cristã. A catequese, de fato, tem fundamento a partir de um primeiro encontro efetivo do catequizando com a comunidade que celebra o mistério, e isso equivale a dizer que a catequese tem plena realização quando ele participa da vida litúrgica da comunidade. Portanto, não é possível pensar na catequese apenas como preparação para os sacramentos, mas ela se compreende em relação à experiência litúrgica. “A catequese está intrinsecamente ligada a toda ação litúrgica e sacramental, pois é nos Sacramentos, sobretudo na Eucaristia, que Cristo Jesus age em plenitude na transformação dos homens” (CT, n. 23). Portanto, a liturgia e a catequese são inseparáveis e se alimentam mutuamente.

97. O caminho formativo do cristão, como é atestado nas Catequeses mistagógicas dos Padres da Igreja, teve sempre um caráter experiencial, mas não negligenciando a inteligência da fé. O encontro vivo e persuasivo com Cristo anunciado por testemunhas autênticas era determinante. Portanto, aquele que introduz aos mistérios é, antes de tudo, uma testemunha. Esse encontro tem sua fonte e seu ápice na celebração da Eucaristia e se aprofunda na catequese.

98. A exigência de um itinerário mistagógico tem por base essa estrutura fundamental da experiência cristã, da qual emergem três elementos essenciais (SCa, n. 64):

a. a interpretação dos ritos à luz dos eventos salvíficos, em conformidade com a Tradição da Igreja, relendo os mistérios da vida de Jesus, particularmente seu mistério pascal, em relação a todo o percurso veterotestamentário;

b. a introdução ao sentido dos sinais litúrgicos, de modo que a catequese mistagógica desperte e eduque a sensibilidade dos fiéis à linguagem dos sinais e dos gestos que, unidos à palavra, constituem o rito;

c. a apresentação do significado dos ritos para a vida cristã em todas as suas dimensões, para evidenciar o elo entre a liturgia e a responsabilidade missionária dos fiéis, além de fazer crescer a consciência de que a existência dos fiéis é gradualmente transformada pelos mistérios celebrados.

A dimensão mistagógica da catequese não se reduz, porém, ao aprofundamento da iniciação cristã após ter recebido os sacramentos, mas envolve também sua inserção na liturgia dominical e nas festas do ano litúrgico com as quais a Igreja já nutre os catecúmenos e as crianças batizadas bem antes de poderem receber a Eucaristia ou antes que tenham acesso a uma catequese orgânica e estruturada.

O testemunho dos santos e dos mártires

99. Desde os primeiros séculos, o exemplo da Virgem Maria e a vida dos santos e dos mártires têm sido parte integrante e eficaz da catequese: dos acta martyrum às passiones, dos afrescos nas igrejas e dos ícones aos contos edificantes para os pequenos e para os não alfabetizados. Os testemunhos de vida e morte pelo Senhor oferecidos por santos e mártires foram autênticas sequentiae sancti Evangelii, passagens do Evangelho capazes de anunciar Cristo e de suscitar e alimentar a fé nele.

100. A Igreja recorda os ilustres mártires da fé, que, com as dificuldades e sofrimentos de seu apostolado, permitiram a primeira expansão e formulação da própria fé. Nos mártires, a Igreja encontra seu germe da vida: “semen est sanguis Christianorum”. 55 Essa máxima não pertence apenas ao cristianismo das origens, mas é válida ao longo de toda a história da Igreja, até nossos dias. O próprio século XX, também chamado de século do martírio, mostrou-se particularmente rico de testemunhas, que souberam viver o Evangelho até a prova final do amor. Seu testemunho de fé exige ser guardado e transmitido na pregação e na catequese, alimentando o crescimento dos discípulos de Cristo. As aparições da Virgem Maria reconhecidas pela Igreja, as vidas e os escritos dos santos e dos mártires de cada cultura e povo são uma verdadeira fonte de catequese.

A Teologia

101. A Revelação de Deus, que supera a capacidade de conhecimento dos indivíduos, não por isso se opõe à razão humana, mas a penetra e a eleva. A busca confiante pela inteligência da fé – ou seja, a teologia – é, portanto, uma exigência irrenunciável da Igreja. “Na Igreja, o trabalho teológico está, primariamente, ao serviço do anúncio da fé e da catequese” (FR, n. 99). Inteligentemente penetra os conteúdos da fé, aprofunda-os e sistematicamente os ordena, com a contribuição da razão. Cristo, porém, não deve ser buscado na reflexão sistemática somente com o raciocínio, mas, como uma verdade viva e “sabedoria de Deus” (1Cor 1,24), é uma presença que ilumina. A abordagem sábia permite que a teologia integre diferentes aspectos da fé. A teologia também “oferece, portanto, a sua contribuição para que a fé se torne comunicável, e a inteligência daqueles que não conhecem ainda o Cristo possa procurá-la e encontrá-la” (DVe, n. 7). 56 A ciência teológica contribui para a catequese e a prática catequística de forma mais geral por meio das diversas especializações que a caracterizam: a teologia fundamental, a teologia bíblica, a teologia dogmática, a teologia moral, a teologia espiritual; e mais especificamente com a catequética, a teologia pastoral, a teologia da evangelização, a teologia da educação e da comunicação.

A cultura cristã

102. A cultura cristã nasce da consciência da centralidade de Jesus Cristo e do seu Evangelho, que transforma a vida das pessoas. Penetrando lentamente nas diferentes culturas, a fé cristã as assumiu, purificou e transformou a partir de dentro, fazendo do estilo evangélico sua característica essencial, contribuindo para a criação de uma nova e original: a cultura cristã, que no curso dos séculos produziu verdadeiras obras-primas em todos os âmbitos do saber. Serviu como apoio e veículo para o anúncio do Evangelho e, no desenrolar de mudanças históricas, por vezes marcadas por conflitos ideológicos e culturais, conseguiu preservar valores evangélicos genuínos, por exemplo, a originalidade da pessoa humana, a dignidade da vida, a liberdade como condição de vida humana, a igualdade entre homem e mulher, a exigência de “rejeitar o mal e escolher o bem” (Is 7,15), a importância da compaixão e da solidariedade, a importância do perdão e da misericórdia, a necessidade de abertura à transcendência.

103. Todavia, ao longo dos séculos, especialmente nas sociedades moldadas pela cultura cristã, chegou-se a uma crise cultural, resultante de um secularismo exasperado que levou a um falso conceito de autonomia. Passaram a ser aceitos somente os critérios baseados no consenso social ou nas opiniões subjetivas, muitas vezes em detrimento da ética natural. Essa “ruptura entre o Evangelho e a cultura é sem dúvida o drama da nossa época” (EN, n. 20). Parece evidente, portanto, a exigência de uma renovada compreensão da capacidade unificadora da cultura cristã (FR, n. 85), de modo a permitir que o Evangelho libere energias de verdadeira humanidade, paz, justiça e cultura do encontro. Essas energias que se encontram na base da cultura cristã tornam a fé mais compreensível e desejável.

104. A cultura cristã tem desempenhado um papel determinante na preservação das culturas anteriores e no progresso da cultura internacional. Ela foi capaz, por exemplo, de interpretar, em espírito renovado, as grandes conquistas alcançadas pela filosofia grega e pela jurisprudência romana de modo a torná-las patrimônio de toda a humanidade. Moldou, além disso, a percepção do bem, do justo, do verdadeiro e do belo, suscitando a criação de obras – textos literários e científicos, composições musicais, obras-primas da arquitetura e da pintura – que permanecerão no tempo como testemunhas do aporte da fé cristã, constituindo seu patrimônio intelectual, moral e estético.

105. Esse patrimônio, de grande valor histórico e artístico, é uma fonte que inspira e fecunda a catequese, uma vez que transmite a visão cristã do mundo com a força criativa da beleza. A catequese saberá valer-se do patrimônio cultural cristão em sua tentativa de “conservar entre os homens as faculdades de contemplação e de admiração que conduzem à sabedoria” (GS, n. 56) e educar, no tempo da fragmentação, a visão da “integridade da pessoa humana, na qual sobressaem os valores da inteligência, da vontade, da consciência e da fraternidade, todos fundamentados em Deus Criador e admiravelmente sanados e elevados em Cristo” (GS, n. 61). O enorme patrimônio cultural cristão, apresentado conforme o pensamento de seus autores, pode mediar eficazmente a interiorização dos elementos centrais da mensagem do Evangelho.

A beleza

106. A Sagrada Escritura apresenta, inequivocamente, Deus como fonte de todo esplendor e beleza. O Antigo Testamento mostra a criação, com o ser humano em seu ápice, como coisa boa e bela, não tanto no sentido da ordem e da harmonia, mas da gratuidade, livre do funcionalismo. Diante da criação, que deve ser admirada e contemplada por si mesma, experimenta-se espanto, êxtase, reações emocionais e afetivas. As obras humanas, como o esplêndido templo de Salomão (1Re 7–8), merecem admiração enquanto ligadas ao Criador.

107. No Novo Testamento, toda a beleza se concentra na pessoa de Jesus Cristo, revelador de Deus e “resplendor da glória do Pai, a expressão do seu ser” (Hb 1,3). Seu Evangelho é fascinante porque é uma Notícia bela, boa, alegre, cheia de esperança. Ele, “cheio de graça e verdade” (Jo 1,14), ao assumir a humanidade, narrou, por meio de parábolas, a beleza da ação de Deus. Em sua relação com as pessoas, disse belas palavras que, com sua eficácia, curam as profundezas da alma: “os teus pecados estão perdoados” (Mc 2,5), “Eu também não te condeno” (Jo 8,11), “De tal modo Deus amou o mundo” (Jo 3,16), “Vinde a mim, todos os que estais cansados e carregados de fardos, e eu vos darei descanso” (Mt 11,28). Ele realizou belas ações: Ele curou, libertou, acompanhou tocando as feridas da humanidade. Suportando a crueldade da sentença de morte como aquele que “não tinha aparência nem beleza” (Is 53,2), Ele foi reconhecido como “o mais belo entre os filhos dos homens” (Sl 45,3). Assim, ele elevou a humanidade, purificada, à glória do Pai, onde Ele mesmo está “à direita da majestade, nas alturas” (Hb 1,3) e assim revelou todo o poder transformador de sua Páscoa.

108. A Igreja, portanto, tem presente que o anúncio do Ressuscitado, para alcançar o coração humano, deve brilhar com bondade, verdade e beleza. Nesse sentido, é necessário “que toda a catequese preste uma especial atenção à ‘via da beleza (via pulchritudinis)’” (EG, n. 167). 57 Toda beleza pode ser um caminho que ajuda o encontro com Deus, mas o critério de sua autenticidade não pode ser apenas o estético. É necessário discernir entre a verdadeira beleza e as formas aparentemente bonitas, mas vazias, ou mesmo nocivas, como o fruto proibido no paraíso terrestre (Gn 3,6). Os critérios se encontram na exortação paulina: “tudo o que é verdadeiro, tudo o que é digno de respeito, tudo o que é justo, tudo o que é puro, tudo o que é amável, tudo o que é honroso, se é virtude ou louvável, nisso pensai” (Fl 4,8).

109. A beleza é sempre e inseparavelmente imbuída da bondade e da verdade. Portanto, contemplar a beleza suscita no ser humano sentimentos de alegria, prazer, ternura, plenitude, significado, abrindo-o ao transcendente. A via da evangelização é a via da beleza e, portanto, toda forma de beleza é a fonte da catequese. Mostrando a primazia da graça, manifestada especialmente na Bem-aventurada Virgem Maria; fazendo conhecer a vida dos santos como verdadeiras testemunhas da beleza da fé; destacando a beleza e o mistério da criação; descobrindo e apreciando o incrível e imenso patrimônio litúrgico e artístico da Igreja; valorizando as mais altas formas de arte contemporânea, a catequese mostra concretamente a infinita beleza de Deus, que também se expressa nas obras humanas (SC, n. 122), e conduz os catequizandos para o belo dom que o Pai fez no seu Filho.



[1] Pontifício Conselho para a Promoção da Nova Evangelização, Diretório para a Catequese. Brasília: Edições CNBB, 2020, pp. 75-84.

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